Franquias: Surfando o bom momento

Franquias: Surfando o bom momento

O salto positivo do mercado de Franchising testemunhado recentemente no país representa um momento de grandes expectativas para o setor

O segmento de franquias, conforme comprovam os dados da Associação Brasileira de Franchising (ABF), voltou ao modo de rápido crescimento. O canal movimentou R$ 50 bilhões no primeiro trimestre deste ano, com crescimento de 17,2% no faturamento na comparação com o mesmo período de 2022. Parte desse crescimento pode ser colocado na conta dos reflexos da pandemia. Não só em relação à normalização do fluxo de pessoas nas ruas e centros comerciais, mas também  pela migração de muitas pessoas para o interior dos estados, em especial com a disseminação do home office e as facilidades oferecidas pelos meios digitais para a realização de reuniões e conferências à distância. “As pessoas saíram de São Paulo, por exemplo, e se mudaram para cidades como Valinhos, Vinhedo e Campinas. O resultado é que, essas cidades, que até então poderiam não comportar determinadas operações, com esses novos migrantes chegando, viram seu potencial de venda aumentar”, explica Juarez Leão, consultor em Varejo, Estratégia e Governança e CEO do Leão Group. Para ele, as empresas estavam de olho nesse movimento e começaram a revisar seus planos de expansão com um olhar mais profundo para o interior e as cidades de menor porte. 

Como consequência disso, as franqueadoras também tiveram que revisar seus modelos de operação e pensar em formatos mais adequados à realidade dessas novas praças. Marcelo Cherto, CEO do Grupo Cherto, consultoria especializada no mercado de franquias, tem notado que a grande maioria das marcas estão investindo em formatos diferentes e menores, como quiosques, lojas de menor porte e até no modelo de co-branding, que é a estratégia de colocar duas ou três marcas diferentes (complementares e não concorrentes) dentro de uma mesma loja, principalmente em cidades menores. “Tem muita gente testando esses modelos. Afinal de contas, a crise (na economia) bateu forte”, lembra Cherto. “Se por um lado tem muita gente querendo empreender, com toda aquela movimentação para as cidades do interior que veio no impulso da pandemia, há também pouca oferta de crédito e dinheiro disponível para investir. Então, a opção é por projetos de formatos menores e, portanto, mais baratos”, emenda.

Esses novos formatos permitem que as empresas reduzam o valor do investimento inicial necessário para abrir uma loja. Inclusive para que essas operações se encaixem no potencial de negócios  dessas cidades de menor porte. “O franqueador desenvolve um modelo de loja mais compacto, mais leve e barato. E o franqueado investe menos e tem um retorno mais rápido do seu investimento”, acredita Juarez Leão, para quem, de olho no movimento que busca maior proximidade com o consumidor, existe a vantagem que os formatos menores oferecem para a expansão de lojas pelos bairros. 

A oferta de diferentes formatos de lojas não é, necessariamente, uma novidade para as marcas de beleza que operam neste canal. A Água de Cheiro, que soma quase 200 lojas em operação, tem trabalhado com quatro formatos para sua expansão:  Loja Pop , Quiosque , Container e Loja Premium. Segundo o diretor da marca, Olindo Caverzan Jr, para manter o crescimento que a empresa vem conquistando ao longo dos últimos anos, foi preciso se preparar do ponto de vista operacional. A companhia tem feito investimentos em operações fabris, logística, sistemas e pessoal. “Existe um senso de responsabilidade por parte da Água de Cheiro no controle das operações fabris , controle de logística e no cuidado com seus colaboradores”, conta Olindo.

Já a marca de perfumação Avatim opera com três modelos de negócios que são implantados de acordo com dados sociodemográficos e econômicos de cada região: o modelo conceito, para capitais e cidades metropolitanas; o modelo slim para cidades com entre 100 mil a 200 mil habitantes; e o espaço Avatim para municípios com menos de 100 mil moradores. “Atualmente, todas as regiões do Brasil possuem grande atratividade para atividade varejista e o consumo, que antes era concentrado principalmente nas capitais, já não é mais”, acredita Monica Burgos, sócia-fundadora da marca que mantém cerca de 100 unidades espalhadas pelo País. Para a empresária, o grande desafio é entender a continentalidade do país e como os aspectos climáticos e culturais influenciam os hábitos e comportamentos de consumo a tal ponto de aproveitar as oportunidades e convertê-las em vendas e crescimento. Além disso, é importante entender as bases de atividades econômicas de determinada região (turismo, serviços, indústria, agronegócios...), quais os índices de crescimento, investimento e o quão dependente daquela atividade a região é. “Assim é possível entender como o comportamento do PIB (geral e per capita) e das taxas de juros influenciam na renda média e no poder de compra das pessoas naquela praça”, explica.

Independentemente do formato escolhido, é necessário que o investimento feito pelo franqueador e pelo franqueado seja sustentável. O ponto de partida disso, na visão da sócia da Avatim, é criar produtos que atendam aos anseios dos consumidores e tenham a capacidade de gerar demanda para as lojas. “Sem demanda, não existe negócio sustentável”, afirma. Feito isso, Mônica aposta no desenvolvimento de produtos que ofereçam boa margem, que vão ajudar na boa rentabilidade do negócio como um todo.  A sócia da Avatim acredita que esse é um dos pilares que sustenta o negócio da empresa desde a abertura da primeira loja em 2010, e que explica o índice de unidades por franqueado da empresa, que é de 2,5 unidades por empreendedor. “O negócio tem boa lucratividade mesmo com toda volatilidade de índices econômicos”, opina.

No caso das empresas franqueadoras mais consolidadas, no caso do setor de beleza, caso de O Boticário, uma forma de sustentar o crescimento tem sido com a abertura de operações de outras marcas para o canal, como quem disse, berenice?, que já tem quase dez anos de vida; e, da recém adquirida  Dr. Jones, marca especializada em cuidados masculinos e que ao longo de sua trajetória testou diferentes formatos de operação. “Uma vez que o mercado começa a ficar esgotado para O Boticário, os novos franqueados podem abrir uma loja, da mesma empresa, mas com outra marca. O que eles estão fazendo com esses movimentos é abrir novos espaços para se manter dentro do segmento de beleza, que continua crescendo”, declara Marcelo Cherto. 

O bom desempenho do canal de franquias, e de todas as atividades, não se sustenta por osmose. É preciso que a economia do País também ajude, ou ao menos, que não atrapalhe os negócios. Num momento em que a economia do Brasil parece ensaiar uma retomada, é de se perguntar até que ponto o momento pode ajudar na expansão e na sustentabilidade do Canal nos próximos anos. Embora os resultados do primeiro trimestre tenham sido de crescimento forte na comparação com o ano anterior, Juarez Leão, diz ter visto um primeiro semestre que não foi tão bom. Mas ele está entre os que têm muito boas expectativas para o mercado de franquias. “Me sinto muito esperançoso em relação ao segundo semestre deste ano. E julho já foi um pouco melhor do que foi o mês de junho”, diz o especialista, que também espera por mais redução nos juros, o que deve favorecer a abertura de mais negócios, já que as taxas de financiamento devem reduzir. “Se observarmos os números dos últimos dois anos, o franchising vem retomando e já ultrapassou os números de 2019. E ao que tudo indica, continuará a crescer. Há uma procura ainda muito grande e há também uma oferta muito grande, com uma competição bem acirrada entre as franqueadoras. E acho que as perspectivas melhoram ainda mais se houver mesmo uma queda significativa nos juros”, explica Cherto. 

Novos formatos e canais digitais
É perceptível o investimento em novos formatos, ou na adaptação de lojas já existentes para que elas estejam prontas para servir de apoio de vendas e logística para os canais digitais, o que demanda muita inteligência num cenário no qual o varejo, de forma geral, busca reduzir seus estoques. Como lembra o CEO do Leão Group, o e-commerce do Brasil, que, na maioria das empresas costumavam representar por volta de 5% das vendas, hoje responde por cerca de 13%. “As empresas franqueadoras tiveram que montar uma forma mais efetiva de explorar esses canais junto com seus franqueados. Você tem a opção de comprar online e retirar na franquia, que, em muitos casos, tem crédito na venda feita e tem a vantagem de, a partir da visita desse cliente, oferecer outros produtos e a fidelizar esse cliente, que, numa futura compra, pode preferir ir à loja para comprar presencialmente ao invés de fazer a compra online. Essa integração de canais hoje tem ajudado a acabar com aquele velho medo, por parte dos franqueados, de enxergar o digital como um concorrente”, explica Juarez Leão. Em muitos casos, as próprias marcas estão usando as lojas de franquias como um hub de logística. “O próprio sistema consulta a loja mais próxima e atribui a venda a essa loja. Acaba sendo uma logística muito mais barata do que mandar diretamente da empresa, que nem sempre está no mesmo estado”, corrobora Cherto. 

Se antes, o varejista costumava se comportar como uma aranha - que constrói sua teia e fica à espera de um inseto que caia na armadilha, como lembra o CEO do Grupo Cherto. “O varejista  montava a loja com uma vitrine linda, estocava os produtos e ficava no aguardo do cliente entrar para ele vender. Hoje ele precisa explorar mais canais. Não pode se contentar só com as vendas da loja física Por isso que os canais digitais, se bem integrados com o físico, são extremamente positivos para isso”, aponta o consultor. 

Integrada ou não, a verdade é que as lojas físicas cumprem um papel fundamental para o varejo. Mais ainda para as marcas de beleza, que lidam muito com questões sensoriais e de bem estar. Essa é uma preocupação muito cara à Avatim, que pensa suas lojas para que elas sejam espaços de experiências hedônicas, com vendedores atenciosos, iluminação atrativa, cheiros agradáveis, texturas e experimentação dos produtos. “O lema da nossa loja é ser um refúgio de boas sensações. Esse foi e continua sendo nosso diferencial competitivo, porque sempre identificamos que o poder de decisão é do cliente”, aponta Monica Burgos, sem ignorar as mudanças que a multicanalidade trouxe para os negócios. “Nosso esforço é atender as necessidades desses diferentes perfis de público, buscando alta disponibilidade de produtos e logística eficiente com as lojas físicas cada vez mais próximas desse público, dando a ele o poder de decisão sobre onde vai comprar e como deseja receber seus pedidos”, garante a empresária.

Outro ponto em favor das lojas físicas apontado por Olindo, da Água de Cheiro, é que o mundo pós-pandêmico trouxe uma consciência e necessidade dos consumidores buscarem um atendimento presencial, embora muitos ainda prefiram a compra online. “Para manter a expansão do canal, produzimos experiências no PDV físico e online, os quais apresentam a marca e nossos produtos de uma forma humanizada aos consumidores. Por diversas vezes presenciamos essa experiência dos nossos consumidores, experimentando nossos produtos e as lágrimas transbordando pelo rosto e quando perguntamos, a resposta é: Essa experiência trouxe uma vida passada maravilhosa para o presente. Lembranças,” conta o diretor da marca.

Categorias de beleza a se explorar no canal franquias
Embora o canal franquias esteja bem disseminado na indústria de beleza, ainda existem categorias que poderiam desfrutar de mais espaço no canal. Marcelo Cherto acredita que os produtos voltados ao público masculino são um mercado promissor e que merece ser mais explorado. “Vimos um crescimento enorme na busca de produtos estéticos e de bem-estar voltados para o homem. A volta das barbearias à moda é exemplo disso. Eu começo e vejo um movimento nessa direção, de criar lojas e pontos de venda exclusivamente voltados ao público masculino. E vejo esse espaço como algo a ser preenchido por franquias especializadas em atender esse público, algo que ainda não temos”, aposta. Já Juarez Leão enxerga na expansão das lojas de beleza multimarcas, como as perfumarias, um modelo que poderia ter mais espaço. “Existem poucas redes de produtos multimarcas operando como franquias. A maioria das redes de perfumaria opera com lojas próprias. Acredito que há muito espaço para crescer dentro do segmento de franquias multimarcas”, opina.

Para Mônica Burgo, as limitações vigentes no Brasil não permitem que se avance tanto em segmentos ainda pouco explorados, em especial os que envolvem tratamentos estéticos, que demandam  maior fiscalização e segurança para uma estética ética. “Tratamentos contra envelhecimento, beleza inclusiva de gêneros, uso do metaverso, o novo masculino, o foco na individualidade diversa, são temas ainda pouco explorados dentro da categoria de beleza”, declara. Aqui vale lembrar o quanto as franquias de serviços de beleza/estética (depilação, unhas, sobrancelhas, etc), avançaram nos últimos anos. Isso abre uma oportunidade para o lançamento de produtos próprios também por essas marcas, ou mesmo oportunidades de parcerias entre indústrias e essas redes. Segundo a sócia da Avatim ambos os casos podem acontecer, tanto por meio de terceirização e licenciamento de marca, quanto colaborações para aumentar e fortalecer marcas. “Tudo vai depender do propósito de eficiência, investimento e retorno esperado. A Avatim já fez diversos licenciamentos como também colabs”, conclui.

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