Pensando fora da caixa

André Elias, diretor de Marketing da DPSP - controladora das bandeiras Drograria São Paulo e Drogarias Pacheco, fala como a rede consegue reinventar seus sortimentos de lojas e seus mixes de gôndolas, por meio da realização do Gerenciamento de Categorias totalmente in-home, num processo que envolve o nem sempre fácil convencimento da indústria, em prol da constante busca por mais produtividade e satisfação dos clientes



O varejo está em guerra por espaço. E isso, de há muito tempo. Em no front do mercado, os “inimigos” dos varejistas de há muito, também, transcendem os concorrentes de negócio – também carinhosamente chamados de “parceiros de ramo” –, para integrar, ainda, os players que atuam em canais diversos, notadamente a venda direta e, em igual escala, a franquia, que não deixa de ser um tipo camuflado de varejo.

No meio do tiroteio, o canal farma – outra vertente do varejo tradicional – busca seu espaço entre os vendedores de cosméticos com especial diligência. Os executivos de farmácia estão se tornando ases em gestão negocial nesse segmento, que começa a vender com pão quente nesses pdvs. Ferramentais complexos, como o de Gerenciamento de Categorias, já não assustam tanto esses lojistas em particular, embora, verdade seja dita, montar gôndolas visando à produtividade, notadamente adequando-as aos hábitos de decisão do consumidor, ainda permaneça um exercício hermético para muitos desses profissionais.

Mas o que não falta é boa vontade, empenho pessoal e até um esforço de conviniência para decupar fórmulas complicadas em busca de uma participação mais consistente das redes no mercado. “O pessoal que trabalha em varejo é sempre polivalente. Por exemplo, tudo  bem um diretor de Marketing responder por gerenciamento de categoria, propaganda, inovação, branding, treinamento... O pessoal aqui toca, cabeceia, cruza, joga no gol... Todo mundo faz um pouco de tudo”, afirma André Elias, diretor de Marketing da DPSP.

O GC como pilar de negócios
O Gerenciamento de Categorias vem rodando de forma regular na Drogaria São Paulo desde o final de 2010. Uma particularidade bastante importante  é que ele é feito totalmente dentro do Marketing. Ou seja, a rede não o delega a fornecedores e/ou parceiros comerciais, criando a figura de “capitães de categoria”. Além de ter um calendário de categorias, para tomar suas decisões no GC, o Marketing não deixa de pedir a opinião para seus principais parceiros comerciais e, ainda, faz pesquisa com shoppers e consumidores. O resultado dessa verdadeira “ascultação” do mercado é levado, então, para uma reunião realizada quinzenalmente na Drogaria São Paulo, envolvendo um grupo plural de seus departamentos, capitaneado pelo Marketing. Dele, participam também o varejo (as lojas), o comercial (Compras e Abastecimento) e, ainda, o presidente da empresa, que avaliza as decisões. E, embora sejam centradas na Drogaria São Paulo, nestas reuniões, acaba-se tomando decisões que, por tabela, acabam afetando também a Pacheco.

“Quando entramos na análise de qualquer categoria, naturalmente acabamos encontrando sucessos e problemas em cada uma delas, do ponto de vista de encaminhamento de negócios, precificação, promocionamento etc. E quando notamos que a categoria no geral está crescendo, mas algum parceiro comercial está tendo margem decrescente, nós o chamamos imediatamente para ‘discutir a relação’”, pontua André.

O executivo admite, entretanto, que nem sempre esse é um trabalho fácil, em função de algumas convicções muito próprias que alguns fornecedores apresentam e que, infelizmente, não se alinham com a maneira de pensar da Drogaria São Paulo. Nesse processo, a via do diálogo costuma funcionar na maioria das vezes. Mas, André confessa que, em casos mais extremos, quando a conversa com os trades da indústria não surte efeito, a rede não hesita em fazer prevalecer sua força e mostrar a esses players, independentemente do seu tamanho, a importância que tem nos negócios deles. “Existem fornecedores, por exemplo, que fazem 50% de suas vendas na Grande São Paulo por meio da Drogaria São Paulo. Assim, em prol do bom senso e da produtividade – nossa e deles –, não hesitamos em, convenientemente, ‘lembrá-los’ disso”, revela André Elias.

Independentemente das quantidades de estoque que existam nas lojas, outra medida que norteia as decisões do varejista no que tange a qualquer categoria é a sua medida de giro, dentro de um intervalo de tempo previsto. Isso porque é exatamente essa medida utilizada no Gerenciamento de Categorias, no nível de demanda, que vai indicar o nível de produtividade de venda/estoque de cada SKU por cluster e por loja.

Um resultado importante dessa dinâmica toda, é que o cliente, quando entra na loja vê mais frescor e organização dos itens ali oferecidos. Contudo, na opinião de André Elias, falar que esse é um fator primordial para a fixação da marca da rede não é uma garantia. “Vejo essa questão como um processo em evolução. O negócio de farmácia é ainda muito igual, mesmo dentro do movimento de concentração, quando quem é grande se torna cada vez maior. O fato de uma rede ser mais vista e percebida não significa, necessariamente, que a marca dela é mais forte. O cliente consegue discernir que vale a pena comprar em uma determinada rede por causa de um conjunto de valores. E, nesse cômputo, muitas vezes, a escolha ainda acaba se dando muito mais pelo baixo índice de rejeição que a rede apresenta, do que, propriamente, pela questão de preferência. Então, acredito que ainda estamos num processo em que as redes estão se diferenciando e criando laços com o consumidor”, afirma o diretor de Marketing da DPSP.

Os resultados desse trabalho estão se mostrando tão positivos, que a equipe dedicada ao trabalho de GC na DPSP está sendo ampliada, o que vai permitir realizar um trabalho mais assertivo também para as lojas da Drogaria Pacheco, algo que deve se intensificar no segundo semestre deste ano, quando houver o tombamento do novo sistema de gestão para as lojas da bandeira carioca.

Questão de inovação
Na amálgama de fatores que envolve o Gerenciamento de Categorias, a questão da inovação também é merecedora de atenção especial nas análises realizadas pela Drogaria São Paulo. Sobre esse aspecto, André observa que o negócio de farmácia depende – e muito – de inovação. E, embora as grandes empresas fornecedoras do canal sejam muito tomadoras de espaço na farmácia – o que, na opinião do executivo, não é bom –, são elas, também, que trazem as maiores inovações. “O que é ruim é quando elas tentam trazer para o farma um discurso de negócio alimentar, quando tentam impor regras de negociação que são limitadoras de espaço na loja, no share de prateleira, numa tentativa de bloquear os concorrentes. E isso, além de ser ruim para a rede, também é um tiro no pé para esse tipo de fornecedor, porque na hora que ele trouxer inovação, teremos que colocar o produto novo no mesmo espaço. O share de prateleira é uma burrice sem tamanho na farmácia.No farma, é preciso ter sortimento maior, com necessidade de geração de inovação maior, sim, mas de uma forma que se consiga reinventar mais no mesmo espaço”, enfatiza.

A proposta de reinvenção, aliás, é uma preocupação constante da equipe multidisciplinar da Drogaria São Paulo quando o assunto é Gerenciamento de Categorias e sortimento das lojas. Mas, ao contrário do que se possa pensar, ela não é suportada por métodos científicos de outro planeta para ser realizada. O protocolo da revisão dos mixes abrange, basicamente, fazer uma análise centrada no bom senso e focada na avaliação combinada de alguns fatores, tais como espaço disponível, que é sempre crítico em qualquer farmácia e rentabilidade de gôndola, buscando, sempre, aferir sua produtividade para a rede e, é claro, facilitar a vida do cliente
Segundo o dirigente, para lidar com a questão é preciso pensar fora da caixa, algo em que a rede vem obtendo muito sucesso graças à pluralidade e a disposição de sua equipe. “Organizar a linha de pensamento para saber aonde queremos ir é absolutamente fundamental. E isso significa olhar que sortimento a gente quer e olhar para fora de sua sala para exercitar uma maior percepção de mundo, o que, no negócio, parece óbvio, mas não é. O que a gente precisa é ter o grupo antenado. E estamos aprendendo a fazer isso”, postula André, complementando que visitar mais os pontos de venda da concorrência, naturalmente, também faz parte do exercício dessa prática.

Boas surpresas
O executivo do Grupo DPSP S/A é rápido em admitir que o porta a porta tem muito a ensinar ao canal farma. Alguns dos campos em que ele acredita que tal interseção pode gerar resultados positivos é na formatação de sortimentos diferenciados e na criação de linguagens específicas de comunicação e de percepção de marca. “A venda direta tem muito mais marcas, até porque ele não tem loja. Ela se ancora em num ideal que está criado. A consumidora de Avon, de Natura de fato acredita em todo um aparato que foi estabelecido e gosta disso. E é inegável que essas empresas fazem trabalhos bastante bem feitos. Isso, naturalmente, se reflete em diferenciação de sortimento e de comunicação. Elas utilizam esses atributos para gerar valorização da marca, e dependem disso, pois na prática, o relacionamento com a vendedora é muito frágil, sendo assim, a venda está ancorada em um processo de amizade e muito dependente dessa crença de que o produto é bom”, pontua André.

Dadas tais constatações, é inegável, segundo o executivo da DPSP, que é preciso dar a mão à palmatória, observar o que o “outro lado” faz e, ainda, reconhecer, com humildade, de aprender com outros canais, incluindo, porque não, a questão dos produtos exclusivos para as farmácias: “Esse pessoal tem know-how para desenvolver, criar e lançar produtos. Podemos aprender com eles não só como desenvolver produtos,  mas também como manter uma imagem de marca mais qualitativa”, define.

Óbvio é, também, que a indústria também deveria aprender com a venda direta. Principalmente em categorias em que ainda patina no varejo, cujo subaproveitamento é atávico no canal farma, como é o caso daquela de skincare. E a grande lição a ser aprendida pela indústria – principalmente pelas grandes multinacionais como P&G, L’Oréal e Unilever –, seria, para André Elias, exatamente, criar uma mecânica mais interativa de clube de comunicação, ou mais integrativa com a força de venda do varejo. “A venda direta faz isso. Mary Kay, Avon fazem as famosas reuniões motivacionais. Será que não vale a pena entender o porta a porta naquilo que possa ser benchmark?”, pergunta.

No entender do diretor de Marketing da Drogaria São Paulo, entretanto, a indústria ainda não está plenamente preparada para exercitar o trade. Segundo ele, o próprio varejo ainda está aprendendo a fazê-lo. Ele explica que, há alguns anos, quando surgiu a terminologia do trade marketing, ele mesmo criou na DSP um núcleo interno aqui chamado “Trade”, cuja proposta ainda está em fase de assimilação pela empresa. “Na prática, o que é o trade para o varejo? Bem, o trade é um núcleo para geração de negócios, ou seja, um núcleo de aumento de vendas e capitação de receitas. Então, na prática, o trade induz as indústrias a ativar o seu produto e, nessa ativação, a investir nos veículos da casa. Fazendo a ativação a gente fomenta a venda, e investindo nos veículos da casa eu capto receita não operacional”, infere André Elias. “No entanto, a indústria vê o trade como uma célula de aproximação com o varejo. Então, a equipe de trade vem até as farmácias para entender a cultura da empresa, saber como as coisas são decididas. Na verdade, para a indústria, o trade é aquela equipe que vai conhecer o varejo e poder traduzir para a indústria os pensamentos do varejo”, complementa.

De uma forma geral, entretanto, o grande problema nessa história, é que os profissionais de Marketing da indústria estão mais ligados à relação com mídia e promoção do que em entender o varejista. Em outras palavras, são raros os casos em que o pessoal do Marketing está disposto a vir junto com o trade e entender e vivenciar o negócio. Também é fato que existem algumas indústrias que estão, hoje, um pouco mais maduras no trade. “A estas eu chamo de casos exemplares. Elas não se preocupam somente em atender o nosso chamado, mas também se propõem a dar algo mais. E, às vezes, elas chegam a nos surpreender com essas ofertas. Sendo mais claro, são empresas que oferecem possibilidades de parceria em diversas direções, porém que não querem impor sua maneira de fazer trade”, relata André.

E é só especificamente nesses casos que o trade acaba se tornando uma viabilização prática de parceria, isso não quer dizer que ele está dizendo sim para tudo, mas que ele está abrindo um canal de mão-dupla de comunicação, de troca, e isso é raro. “Na prática, o trade hoje está quase todo instituído em todas as empresas. Porém, existem indústrias hoje que tendem a nos surpreender positivamente, conseguem ser realmente parceiros”, sublinha o dirigente da DPSP.

Para que, na prática, o canal farma consiga trabalhar com mais categorias interessantes na farmácia, como, por exemplo, maquiagem e perfumaria, a intervenção da indústria tem sido fundamental. André Elias afirma que nas grande empresas existe muita gente preparada. Porém, fazendo um “mea culpa”, ele ainda afirma que, não raro, esses projetos demoram mais por conta da inoperância do canal farma e da limitação natural das equipes que trabalham nas redes, do que, propriamente, por conta da indústria. E ainda existem determinados projetos em que o problema nem é equipe e o tempo, mas o dinheiro. “Muitas vezes, o difícil é você conseguir convencer a Diretoria ou os acionistas das redes de que vale a pena investir naquela reformulação. Quando o projeto é integralmente custeado pela indústria, fica fácil você aprovar. Porém, quando não é assim, às vezes, o projeto pode esbarrar nesses desdobramentos do quanto custa”, finaliza o executivo.

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