Bem-estar em estado de arte

Bem-estar em estado de arte
A atenção que a Natura dá aos temas de bem-estar e relações humanas é pública e notória. Agora, com um investimento em parceria com instituições científicas e de ensino, a empresa pretende levar essas ciências a um novo estágio

Em meados dos anos 1990, a Natura lançou Mamãe e Bebê, uma marca para celebrar a relação entre as mães e suas crias. O produto foi um sucesso imediato e até hoje permanece no portfólio da empresa. E esse sucesso se deve muito a fatores que extrapolam o item em seus aspectos físicos. Formulação e fragrâncias eram excelentes, e a embalagem foi a primeira do setor de cosméticos brasileiro a ser premiada pela organização mundial de embalagem, um marco para a indústria nacional. Mas o que fez de Mamãe e Bebê algo tão especial foi que a linha incorporava de maneira muito verdadeira o conceito da Shantala – uma técnica que consiste em massagens para relaxar o bebê e que poderiam ser feitas com o uso do produto. Ali apareceu de maneira clara e estruturada dois dos pilares mais importantes para a Natura: a força das relações interpessoais e a proposta de bem-estar, que no caso conjugava o produto com o gestual de aplicação. No decorrer desse tempo, a Natura, que já era uma empresa grande, se tornou gigante – mais complexa e sofisticada em todos os seus processos –, mas nunca abriu mão dessas crenças. Pelo contrário, eles fazem parte do tripé de inovação da Natura e, mais importante, constituem valores fundamentais da marca.
Duas décadas depois de Mamãe e Bebê, a Natura está investindo num projeto que vai elevar a questão do bem-estar e das relações a patamares científicos nunca alcançados no Brasil. Em parceria com a Fapesp, órgão do governo de estado de São Paulo de apoio a pesquisa, a empresa inaugurou o Centro de Pesquisa Aplicada em Bem-Estar e Comportamento Humano. A iniciativa reúne uma rede de pesquisadores multidisciplinares da Universidade de São Paulo, da Universidade Federal de São Paulo e da Universidade Presbiteriana Mackenzie.

O investimento total no projeto é de R$ 40 milhões ao longo de dez anos. São R$ 20 mi para a implantação e condução das atividades do centro de pesquisa – divididos igualmente entre Natura e FAPESP –, e uma contrapartida equivalente das universidades, na forma de salários, infraestrutura e apoio institucional e administrativo aos pesquisadores envolvidos. Será o maior núcleo científico do País voltado ao tema e terá como objetivo impulsionar as pesquisas na área, por meio da integração de diferentes linhas do conhecimento – como neurociência, psicologia social, psicologia positiva, ciências da saúde, humanas e sociais aplicadas. A psicologia vai estudar o comportamento e as causas do comportamento, enquanto a neurociência vai estudar o impacto neural daquilo sobre o nosso corpo.
Do lado da Natura, o projeto nasceu da crença de que o cosmético é muito mais que só um produto físico, mas um instrumento de prazer e de bem-estar, que está na gênese da empresa que trabalha com essa proposição em tudo o que faz. E a escolha pelo formato de parceria foi natural para uma empresa que há anos vem investindo na inovação aberta. “Trabalhamos com universidades, fornecedores e institutos por entender que o potencial de inovação da Natura vai muito além das suas fronteiras e que ela fica mais forte quanto mais conectada estiver com esse ecossistema”, diz Gerson Valença, vice-presidente de Inovação da Natura.

FOCO DE INOVAÇÃO
Bem-estar e relações representa um dos três eixos de inovação da Natura, ao lado de tecnologias cosméticas (os ativos e ingredientes, por exemplo) e tecnologias de sustentabilidade. “Buscamos sempre a integração entre benefícios funcionais, sensoriais e emocionais com o produto indo além das suas denominações que tem existido ao longo da história”, conta o executivo. “Uma tecnologia mais funcional, conectada a um bom sensorial te leva a uma boa emoção.”

Para Gerson, a empresa aposta na grande oportunidade que existe em avançar no tema bem-estar, olhando para o mercado local no sentido de entender o que é bem-estar no Brasil, quais suas dimensões e instrumentos de promoção. Com isso, a empresa espera descobrir coisas para agregar não só o produto em si, mas também gestuais, massagens, terapias e outras experiências que possam complementar o entendimento da população e melhorar a experiência das pessoas. “A gente pensa muito na indústria cosmética só o produto, a formulação e deixamos de pensar no ser humano, de enxergar como esse produto interage com ele e como pode promover o bem-estar para a pessoa”, explica. “Com a inovação aberta pudemos fazer um projeto ambicioso, pioneiro. A gente não tem todo esse conhecimento dentro da Natura e nem queremos ter. Queremos nos conectar, cooperar e assim a criar valor para a sociedade e para a produção científica do Brasil. E criamos valor para os nossos consumidores traduzindo esse conhecimento científico através de novos conceitos, novos produtos, novas experiências, novas terapias e possibilidades.”

Ao longo da sua história, a Natura sempre estudou questões relacionadas ao bem-estar e as relações, para basear os conceitos de seus produtos. Mas agora, o que a empresa busca é um entendimento mais profundo do ser humano, todas as possibilidades de ampliação da experiência que estão ao redor do produto. É essa ampliação do olhar que está no cerne do projeto para a Natura.

O Centro tem um modelo de governança compartilhado, com a Natura compondo a equipe de liderança junto com a universidade e participando ativamente da construção do projeto. A empresa mantém dentro da área de inovação uma gerência específica de ciências humanas e relações. Essa área vai fazer um espelho entre a estrutura da Natura e da universidade, trabalhando junto na governança, fazendo o acompanhamento e identificando oportunidades que possam se transformar em produção científica, mas também fazer rapidamente a tradução de coisas que podem gerar novos conceitos, produtos, serviços e experiências para as consumidoras da marca. Por isso, a empresa mantém um grupo multifuncional que congrega equipes transversais de inovação e marketing que fazem o acompanhamento dessas oportunidades.

Para Emma Otta (no foto, apresentando o projeto com os fundadores da Natura na plateia), professora titular do Departamento de Psicologia Experimental da USP, que coordena o projeto ao lado de Patrícia Tobo, gerente científica de Ciências de Bem-Estar da Natura, o projeto escapa de uma visão rasa do que seja bem-estar. “Foi uma surpresa verificar que, em suas pesquisas, a Natura olha não só para a parte química, que seria o mais óbvio, mas também para algo que escapa. Produtos como Mamãe e Bebê e a linha dos avós têm um componente de trabalho que estudava o comportamento dessas relações”, diz a pesquisadora, que acredita que a Natura está buscando algo que vai muito além do que uma aplicação imediata em produtos. Naturalmente, durante as pesquisas, serão apresentados estímulos, que podem passar por cheiros, uma vez que o olfato tem um componente de memória importante, mas esses estímulos não necesariamente vão estar relacionados aos produtos. Mas será possível, por exemplo, saber como pessoas de diferentes regiões do Brasil reagem a determinados cheiros. Isso pode ser traduzido futuramente em produtos mais direcionados do ponto de vista regional. “Hoje, é fácil a empresa se apoiar em um slogan de apelo social ou ambiental. A pesquisa científica permite que essa área com a qual a Natura trabalha não seja uma mera chamada de marketing, mas que tem uma base científica na proposta”, acredita Emma.

EM PROL DA SOCIEDADE
O produção científica gerada pelo projeto se propõe a servir à sociedade mais do que à própria Natura. O projeto terá publicações que são voltadas para patentes, mas esse não é o único bem gerado por ele. Pesquisas na área de educação terão seus resultados compartilhados com o conjunto da sociedade por meio de parcerias com escolas, para que as pessoas possam parametrizar suas próprias situações lastreadas pelo conhecimento objetivo gerado na universidade. Além disso, a pesquisadora ressalta que as empresas também não estão mais só preocupadas com o produto, a patente e a fórmula. “O consumidor está tão exigente que, cada vez mais, as empresas querem agregar um valor simbólico para o que produzem. A ideia não é achar um cheiro que traz bem-estar, mas agregar a marca Natura a uma pesquisa sobre bem-estar. “

Por fim, o projeto tem um componente importante que é o diálogo, que ele promove entre pesquisa conceitual e aplicada, pelo setor governamental e o setor privado. “São diversas aproximações que podem caracterizar um novo modelo. Vencemos uma barreira que é o de que só a pesquisa dura e aplicável. Essa ciência é muito boa para dizer como as coisas são feitas, mas as ciências humanas vêm para dizer porque que as coisas devem ser feitas, de acordo com as necessidades do ser humano. Essa pesquisa está bem amarrada nas duas pontas, juntando pessoas com ideias diferentes e atendendo à sociedade nessas duas dimensões. E não podemos esquecer que esse projeto estimula a ciência no Brasil e uma ciência autóctone, não estamos copiando nada de fora. Isso já é um produto extremamente importante”, complementa a pesquisadora.

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